domingo, 8 de novembro de 2009

Presentes

O meu chefe quer que eu continue no Banco. Não se privou a me dizer que eu sou profissional, calma, inteligente, discreta, que acha que eu tenho feito progressos extraordinários, que aprecia muito a qualidade do meu trabalho e até acha que tenho o perfil ideal para crescer bastante dentro do Banco... E embora ainda falte o acordo dos directores, da direcção de orçamento, etc, e nada esteja escrito, não consigo imaginar melhor coisa neste momento que um contrato com eles... vejamos, é uma espécie de matrioska, uma grande prenda com montes de prendinhas umas dentro das outras... é fazer o que gosto, é poder aprender, são dois anos de experiência preciosa, é uma promessa de carreira, é um salário digno, são umas férias merecidas... é a melhor prenda de Natal do mundo! Não cesso de me surpreender com a vida, que nos enrola, nos gira de olhos tapados e nos atira para futuros improváveis sem que nos demos conta de nada!
Uma simples frase do meu chefe e um novo mundo de esperança se abre para mim... e naquele instante, num open space impessoal do segundo maior banco de França, na minha frente estavas tu, minha Biu, pálida de dois anos na cama articulada, uma carcaça a agarrar-me o braço com força até doer e a sussurrar-me, como se fosse segredo, sabes, minha filha, todos os dias Deus dá-nos um presente...